quinta-feira, 4 de junho de 2009

Saí do salão de baile



A gôndola deslizava suavemente pela água, procurando saber que rumo tomar. O nevoeiro era espesso, não deixando alcançar o destino.
Nesta altura, eu não estava preocupada com nada, a não ser livrar-me dos adereços mais valiosos.
Pela primeira vez na vida tinha conseguido assumir o controlo, quando saí do salão de baile. Até aqui davam-me ordens que me limitava a cumprir e digamos que é mais fácil.
Mas hoje, tinha prometido a mim mesma que ia assumir o papel principal, que ia sair das sombras, nem que fosse uma vez na vida e ver como me saía.
O tempo estava a mudar. A chuva branda que vinha a cair desde que a gôndola tinha saída da bela mansão, cessara subitamente. As águas cinzentas iluminaram-se, transformando-se em prata, e o sol a pôr-se irrompeu de súbito das nuvens. As brumas desvaneceram-se como se por ordem de um feiticeiro e a cena , um desenho a tinta, monocromático há pouco tempo atrás, era agora uma aguarela gloriosa.
Raios de ouro distintos espalharam-se pelo céu, captando a floresta de postos de ancoragem a erguer-se da água. O ar brilhava com a incandescência prateada pela qual a cidade era conhecida, fazendo tudo parecer irreal.
Quando a gôndola ancorou, o meu coração era como um martelo de ferro a bater contra o vidro frágil das minhas costas, mas era a sensação mais agradável do mundo.
Desci levantando a saia de veludo e o que vi fez-me suster a respiração. Um imenso mar de figuras mascaradas, tantas quantas as ocasiões e os destinos, uma profusão de cores inimagináveis, sem dúvida, a realeza de uma pintura renascentista.
Senti uma descarga de prazer a percorrer-me, a cidade mais bela e misteriosa do mundo.
Avancei e misturei-me com a multidão, como era possível não ter medo? Por trás de uma máscara poderia estar um ladrão e sabe-se lá o que mais. Mas a vida é mesmo assim, plena, bela e terrível, de dia e de noite.
Agora eu sabia o que era viver: era o preferir seguir em frente, enfrentar os desafios e lutar contra as dificuldades. Fazer aquilo que se tem que fazer e gozar a vida.
Até ao momento limitava-me a viver, porque via os outros viverem, mas agora eu sabia o verdadeiro sentido da vida. Não eram os bailes de máscaras glamorosos de uma classe de elite e intelectualizada, onde as pessoas se conhecem umas às outras e estão mais preocupadas em não fazerem nada de errado do que se divertirem, que me deixavam viver. Antes pelo contrário, sufocavam -me.
De repente, o fogo-de-artifício irrompeu e eu descobri que esta mescla maravilhosa de esperança, incredulidade e magia os igualava a todos, nivelando condições e classes sociais.




Manuela Faria, 12ºB

1 comentário:

Fátima Inácio Gomes disse...

Mas estas meninas surpreendem-me imenso! Então, também temos veia ficcional?... ;-)
Pois vais ter que me mostrar mais disso, caríssima Manuela. Deixa-me acompanhar essa viagem, se é que não ficou por aí...

E, já agora, já foste a Veneza, ou vive apenas no teu pensamento?